segunda-feira, 25 de julho de 2016

UM TRABALHO PARA A VIDA




Só a maturidade pode nos dar o verdadeiro entendimento do que esperamos de nossos animais... e de nós mesmos
“A palavra old, que em português quer dizer antigo ou velho, é também uma expressão bem antiga, que se supõe ser derivada de uma raiz indo-européia que significa nutrir. Seguindo a pista dessa palavra no gótico, no norueguês antigo e no inglês antigo, descobrimos que uma coisa antiga é inteiramente nutrida, crescida, amadurecida”. James Hillman, psicanalista junguiano.
No fim do ano completo 65 anos de idade e 40 de estrada, lidando com pessoas, cavalos e gado. Sinto que quando mais velho vou ficando, mais me surpreendo, me decepciono, fico feliz, me aflijo, me deprimo e fico encantado comigo mesmo. Na verdade, percebo que sou tudo isso o mesmo tempo. E mais: percebo também que não há nada que eu tenha bastante certeza. No entanto, a cada dia que passa percebo o quanto essa experiência com pessoas, cavalos e gado tem me preenchido. Os textos que recebo das pessoas com as quais me envolvo são a prova vida desse processo todo.
Ficar mais velho, mais antigo dentro dessa trajetória me faz sentir nutrido, crescido, amadurecido. Esse amadurecimento vem me mostrando cada vez mais que Educação Equestre e Equitação começa com o cavaleiro e não com o cavalo. Ninguém vai ensinar um cavalo a andar, trotar, galopar, parar, recuar, virar para a esquerda ou direita. Ele já nasce sabendo fazer tudo isso. O nosso assunto agora é ensiná-lo a fazer tudo isso a partir de nosso pedido.
Cavalos vivem o aqui e agora no sentido mais amplo da palavra. Tudo que lhes importa é o conforto físico, mental e emocional. Qualquer interferência nesse conforto provoca medo, ansiedade, insegurança e desconfiança.
Foi o conceito de Feel, Timing & Balance (Sensibilidade, Timing & Equilíbrio) que me levou a uma outra dimensão no que diz respeito à Educação Equestre e a Equitação. É aquela famosa expressão espanhola “Dos es Uno”. O cavalo sou eu.
Foi a partir desse conceito que comecei a não me satisfazer mais com os resultados que vinha conseguindo. Não percebia o cavalo trabalhando comigo. Ele trabalhava para mim ou contra mim. Não tinha consciência de que antes de tudo o cavalo é uma atitude. Não dava ele a chance da escolha.
Compreendi que para ter essa profundidade, isto é, perceber o cavalo como uma atitude, precisava aumentar a minha capacidade de percepção e escuta. Se quero ensinar alguma coisa ao meu cavalo é fundamental que eu saiba onde está a sua atenção. Como o mental e o emocional entram em contato com o seu corpo. Era uma outra amplitude da relação Cavalo-Cavaleiro. Precisava aprender a ver o cavalo se preparando mentalmente para executar o que eu tinha pedido pra ele fazer. Por exemplo, como saber qual pata que iria começar o movimento?!?
Conforme o nosso “Feel, Timing & Balance” vai melhorando, começamos a ver o reflexo que tudo que está na sua mente e no seu emocional, no seu corpo. Tensão, relaxamento, intenções, distribuição de peso, etc...
Vou dar um exemplo bem simples. Quando estou trabalhando no chão, o meu cavalo está parado na minha frente e peço para ele sair num círculo para a direita, preciso perceber a sua intenção. Se ele olha para a direita e dá o primeiro passo usando a mão direita, posso dizer que ele estava mentalmente conectado comigo. Caso ocorra o contrário, ou seja, se ele estiver olhando para a esquerda e o peso estiver na paleta esquerda, sei que ele está pensando para a esquerda, então posso prepará-lo antes que aconteça aquilo que vai acontecer. Desencorajo aquela atitude e tenho a chance de prepará-lo melhor para o que estou querendo.
Para todos aqueles que estão iniciando, seja no esporte, trabalho ou lazer, não acredito que possa existir nada melhor para começar do que nos “Trabalhos de Chão”. Ele nos proporciona conhecer o cavalo como um todo (física, mental e emocionalmente) e abre as portas para que o cavalo também possa nos conhecer.
Depois que comecei a lidar com cavalos tendo como meta principal da minha Educação Equestre o desenvolvimento do meu “Feel, Timing & Balance”, compreendi que o melhor de tudo foi aprender a acolher o que acontece. Não importa se bom ou ruim. Quando trabalhamos com seriedade e disciplina, consciência e humildade, decepções e frustrações se misturam com alegrias, satisfações e encantamento.
Não há como aprender Educação Equestre e Equitação sem passar por isso. Acredito que talvez essa seja a maturidade que estamos falando.
Revista Horse Edição 38 - Outubro 2011 - Doma em Progresso.
Eduardo Borba
Projeto Doma

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